ALEGRIA: o outro nome de Deus!

Estamos praticamente às vésperas do Natal! A quatro domingos atrás iniciávamos este tempo favorável de vigilância e oração sob o símbolo da mística da coroa do advento. Não é difícil compreendermos o seu sentido: a cada vela acesa a luz se intensifica, vencendo as trevas e iluminando o coração com a verdadeira luz que nos mantem despertos: Jesus! Afinal nos conclama a Palavra: “Desperta, tu que dormes! Levanta-te dentre os mortos e Cristo te iluminará”! (Efésios 5, 14b. Is 26, 19; 60, 1). Esta luz, nascendo pequenina na gruta pobre de Belém, revestir-nos-á de uma esperança benfazeja a fim de compreendermos, espiritualmente, as idas e vindas da própria vida, os paradoxos que nos fazem chorar e rir, crer e duvidar, alegrar-se e entristecer-se, fidelizar e trair, guardar e partilhar, resistir e ceder… e por aí afora. Tudo é graça, Deus nos conduz!

No fundo, se bem o compreendermos, nada pode impedir que Deus espraie a alegria ao coração da humanidade: no princípio era a alegria, a Santa Alegria, que decidindo em seu mistério “contagiar” o mundo inteiro e a humanidade em especial (que ainda não existia) com seu amor, fez a luz (Gn 1, 3) e a humanidade à sua imagem e semelhança (Gn 1, 26). Desde então, não cessa de cuidar de nós convocando-nos a cada dia a nascermos de novo para a verdade do seu Reino, onde justiça e paz irão se abraçar.

Assim, como uma “mistagoga” do Pai (aquela que nos insere no mistério de Deus) a Igreja nos conclamava, no terceiro domingo do advento, a nos alegrarmos em Deus. Celebrávamos, naquela ocasião, o domingo gaudete, ou da alegria, devido, como sabemos, à primeira palavra do prefácio da Missa que reza: alegra-te! A outra ocasião em que esta alegria Santa é proclamada é o domingo laetare, na quaresma, que nos conclama ao júbilo pascal. Alegria e júbilo, pois, colocam num mesmo mistério de amor o nascer e o morrer, o natal e a páscoa, a manjedoura e a cruz, numa espécie de antecipação sempre possível, no coração da Igreja, do mistério do Redentor. Nossa “espera”, assim, é hiperbólica, ou seja, olhamos para a manjedoura, mas com os olhares fixos na cruz e na pedra rolada do sepulcro vazio, exultando com os anjos: “não está mais aqui, ressuscitou!” Nascer, morrer e ressuscitar é, pois, o que sempre esperamos e assim o podemos porque o Cristo nasceu, morreu e ressuscitou! Só assim é possível compreendermos que o canto tão popular do Noite Feliz, proclame, ao mesmo tempo, dois mistérios: da feliz noite do nascimento na manjedoura pobre da gruta de Belém e o da feliz noite que tendo escondido o corpo do Senhor vê a aurora anunciar a luz do ressuscitado!

Mas não romantizemos essa noite tão grave em sua urgência numa espécie de “era uma vez… e viveram felizes para sempre!” Deus não se cansa de interpelar-nos ontem, hoje e sempre. Trata-se de um realismo extremo e de um apelo espiritual inconteste: na mesma noite, só para ficar com um exemplo (os outros cada um de nós vamos aplicando à nossa própria realidade), a cantata de natal chega aos “ouvidos” de Deus cantada tanto pelas famílias abastadas de condomínios fechados e luxuosos que celebram a fartura de alimento na mesa, quanto pelas famílias dos favelados casebres e suas “quentinhas” doadas por alguém que sensibilizado, via olhares famintos de crianças que salivavam ao cheiro das iguarias. Todos cantam NOITE FELIZ… uns mais agradecidos, outros quase desesperançados pelas injustiças, mas todos proclamando a natalícia cantata… e Deus vendo e ouvindo os clamores dos filhos seus, acolhendo como um único pai, no paradoxo do amor, gratidão e esperança; bonança e miséria.  

Como não concluir que do coração de Deus, que costuma agir com entranhas de misericórdia, emerja mais uma vez e sempre um “suspiro” profundo de amor e um renovar sempre constante da ordem eternal: “vai, Filho de minha alegria, invade com nosso Espírito mais uma vez os corações dos homens, a quem decidimos criar à nossa imagem e semelhança. Nasce mais uma vez e sempre benfazejo no coração de meus filhos, teus irmãos. Da gratidão dos que muito tem, faze nascer a verdadeira partilha que inicia pela justiça e pela não-indiferença com o sofrimento alheio, o nosso Reino; aos que quase tudo faltam, de sua miséria criada pelas mãos dos próprios homens, faze nascer a perseverança da fé que não desanima e edifica no bem os homens de boa vontade. Vê: eles te chamam: MARANATHA!.Vai… não demoremos mais”. A antecipação da Santa Alegria se justifica porque o Senhor já veio na plenitude dos tempos e cumpriu sua obra em fidelidade ao Pai. Agora aguardamos o desfecho final de nossa fé na misericórdia divina que nos impulsiona a fazermos o bem e agirmos com justiça. Entre esta primeira vinda de Cristo e a sua parusia, sua manifestação definitiva que somente o Pai sabe o dia, esforcemo-nos por permitir que ele nasça nas manjedouras de nossos corações, de nossas famílias. Sobretudo, que a casa dos pobres sejam nossos nobres presépios e acorramos a elas com nosso melhor ouro, nosso melhor incenso, nossa melhor mirra. Presenteemos os pobres com nosso engajamento em mudanças efetivas que anunciem ao mundo que nascemos e morremos com o Cristo para com ele e seus pobres participarmos da glória do Reino, lá nos céus, um dia, e ainda mesmo aqui, na terra, lutando contra as injustiças e o pecado enquanto a plenitude não chega.

Diácono Robson Adriano