Advento: preparar-se para a chegada do noivo

Com o Tempo do Advento, que começa quatro domingos antes do Natal, iniciamos um novo ano litúrgico. Nessa espiral do calendário, vamos celebrando as ações de Deus (chamadas “mistérios”) na vida de seus filhos. A palavra “advento”, originária do latim, referia-se à espera da visita de um imperador. Como ocorreu com outros termos, o conceito foi apropriado pelos cristãos, aqui significando, desde o início, a expectativa pela volta de Jesus, no fim dos tempos (Mt 24,27). O correspondente grego é a palavra parusia (a forma sem acento é a mais usada no Brasil) ou parúsia.

Nós, latino-americanos, normalmente somos muito calorosos e acolhedores, por isso nos é fácil entender o espírito desta época. O Advento equivale ao que sentimos quando recebemos a notícia de que uma pessoa muito querida, e a qual não vemos há muito, virá nos fazer uma visita. Quanta alegria! Limpamos a casa, trocamos os lençóis e as toalhas, preparamos deliciosos quitutes.

É muito limitado dizer que este período é uma preparação para o Natal. Nestas quatro semanas, de fato, celebramos as três possibilidades do encontro com o Senhor, segundo São Bernardo de Claraval: o primeiro, o intermediário e o último.

O primeiro é o da encarnação do Senhor no seio de Maria e nascido como um pobre, num estábulo. Deus, em Jesus, tornou-se um de nós, portanto divinizando nossa condição humana. É o Deus que se fez pobre e rei (este não como pensa o mundo, diga-se!). Não é uma mera lembrança, mas um memorial solenemente celebrado no Tempo do Natal, que começa ao anoitecer do dia 24 de dezembro e vai até a Festa do Batismo de Jesus. São dias em que, pela sagrada liturgia, colocamo-nos diante da manjedoura e testemunhamos a manifestação (epifania) do Messias à humanidade.

O encontro intermediário é aquele que ocorre a qualquer hora, a depender de nossa disposição em se deixar abraçar por Deus. O Senhor vem a nosso encontro no Pão da Palavra, nos sacramentos, na oração, nos irmãos e irmãs, em especial nos mais fracos e excluídos.

A vinda futura de Jesus é o foco maior do Advento, pelo menos esse foi o intento dos cristãos dos primeiros séculos, ainda antes de uma formulação litúrgica deste período. Nos Evangelhos, o Senhor nos alerta para a necessidade de estarmos acordados para o encontro definitivo com Aquele que, sem qualquer aviso, vem a nós. Diferentemente de certos pensamentos ingênuos e ultrapassados, esse dia terá o tom da alegria, pois a Igreja (a grande comunidade dos batizados), a noiva, será beijada com muito carinho pelo Amado, que virá correndo a seu encontro. Essa linda noiva deve estar bem preparada para esse dia: vestida de justiça, adornada pelas joias da oração e do cuidado com os mais necessitados, trazendo o anel da misericórdia e o ramalhete do amor.

Serenidade na liturgia

O Tempo do Advento tem algumas particularidades interessantes quanto à liturgia. As leituras envolvem personagens admiráveis, com destaque a três figuras: o profeta Isaías, alimentando-nos com magníficos textos sobre a esperança (nunca precisamos tanto dela como agora!); São João Batista, que veio preparar os caminhos do Senhor; e a Virgem Maria, com seu “sim” ao projeto de Deus, mulher corajosa e modelo para todos nós.

Os hinos, costumeiramente muito bonitos quando os ministros do canto seguem o espírito da celebração, levam-nos ao recolhimento e nos chamam à conversão (volta ao caminho seguro). Não se canta o “Glória”, exceto nas solenidades e festas que caem nesse período. O chamado “Hino Angélico” é entoado com toda a alegria a partir da celebração da noite de 24 de dezembro (já no Natal). Ao contrário do que ocorre na Quaresma, a expressão “aleluia” pode ser entoada.

Os ornamentos são sóbrios, mas não com a austeridade quaresmal. A cor roxa nos recorda que a casa de nosso coração está sendo preparada para a festa do encontro. No meio do Advento, no terceiro domingo, os paramentos róseos anunciam que a hora da grande alegria está chegando. Esse domingo é chamado Gaudete (alegrai-vos), devido à antífona de entrada: “Alegrai-vos sempre no Senhor. De novo eu vos digo: alegrai-vos! O Senhor está perto!” (cf. Fl 4,4s). O ideal é que os enfeites natalinos sejam expostos do dia 24 até o fim do ciclo do Natal (que, reforço, não se encerra em 6 de janeiro).

Desde o primeiro domingo, as igrejas são adornadas com a coroa do Advento. Esse costume pagão foi ressignificado pelos seguidores de Jesus. A ideia é mostrar que, a cada vela acesa conforme avançam os quatro domingos, a luz do Senhor vai vencendo as trevas. É importante que o nascer dessas chamas seja visto por toda a comunidade, mesmo num momento de silêncio.

A partir de 17 de dezembro até o entardecer do dia 24, temos o que alguns chamam de “Semana Santa do Natal”. As leituras enfocam mais a primeira vinda do Salvador e insistem nas profecias sobre o cuidado de Deus para com seu povo. É impossível falar desses dias sem mencionar as dulcíssimas “Antífonas do Ó”. São breves versos cristológicos entoados sobretudo nas orações das Vésperas, na Liturgia das Horas, cuja beleza todo o povo é convidado a conhecer.

As manifestações populares de fé também têm vez nestes dias, a depender da cultura de cada lugar. A mais famosa em nosso país é a “novena de Natal”, um tesouro que tem produzido abundantes frutos espirituais em nosso povo. Ocasião indispensável para reunir a família, vizinhos e amigos em torno da Palavra e em espírito de fraternidade. É muito louvável que as crianças participem dessa prática.

Qualidade do Advento e do Natal

Há de se lamentar que um tempo tão frutuoso para nossa caminhada seja ofuscado pela correria às lojas, pela má preparação das liturgias ou mesmo pela ignorância a respeito do que se celebra. Nos dias em que “arrumamos a casa” para uma visita tão preciosa, ganhamos mais um convite de Deus a abandonarmos velhos costumes, caminhos tortuosos e voltarmos à estrada segura de Cristo.

Concluo com um trecho do saudoso verbita padre Tomaz Hughes, numa reflexão sobre o Evangelho do quarto domingo deste tempo: “A qualidade de nosso Natal dependerá, em grande parte, da qualidade de nosso Advento […]. Caso contrário, somente teremos uma festa no dia 25 de dezembro, que logo acabará e passará sem deixar rastros, a não ser dívidas a pagar ou ressacas”.

Uma feliz expectativa a você, sua família, sua comunidade! Vem, Senhor Jesus!

Artigo publicado originalmente no blog da Província Brasil Norte da Congregação das Irmãs Missionárias Servas do Espírito Santo (SSpS): blog.ssps.org.br

Alessandro Faleiro Marques

Diácono permanente na Arquidiocese de Belo Horizonte, professor, editor de textos para as irmãs servas do Espírito Santo.

São fortes os braços de uma mãe, quando seu filhos estão em perigo!

O mês de maio já quase findava e as expressões da fé mariana, durante todo o mês, haviam enchido nossos corações de santa alegria. Entre todas as devoções populares, as que procuram manifestar nosso amor, respeito e carinho para com a Mãe do Deus Filho, o nosso Senhor Jesus Cristo, considero as mais expressivas. Pois bem, Angélica chegou perto depois de um momento celebrativo de encerramento do mês mariano e foi logo me agradecendo: – Obrigado, Robson, por apresentar-me uma mãe tão terna e compreensiva. Estive prestes a deixar a fé cristã católica mas percebi o quanto os braços de uma mãe são ainda mais fortes quando seus filhos correm perigo. Fiquei sem entender muito bem o agradecimento, bem como tudo que ela me disse. E percebendo minha dificuldade foi se explicando.

“Estava por um fio em relação a sair da igreja e buscar um rumo espiritual qualquer! Influenciada por inúmeros parentes que já haviam abandonado a Igreja Católica e enfraquecida na minha fé, estava quase completamente disposta a ir embora. Foi quando você fez uma visita pastoral lá em casa, no início do mês de maio, encorajando-me e à minha família a participarmos das devoções que se fariam à Virgem Maria durante o mês. No início, neguei interiormente mas confesso – continuava ela – que uma palavra simples que me disse, ficou retumbando aqui dentro o dia todo, até que me convenceu, embora ainda desanimada, a participar daquele momento. A frase foi: ‘os braços de uma mãe são ainda mais fortes quando seus filhos correm perigo!’ Eu sou mãe, e sabia disso com toda a força de minhas lutas diárias. Sabia o quanto uma mãe tira forças para proteger e encaminhar os seus filhos. Poderia essa mulher a quem chamamos, com razão, de “mãe espiritual”, valer-me em meu cansaço e quase descrença? À noite lá estávamos nós, prestes a iniciar a devoção mariana com a oração do terço. Entretanto, antes de iniciarmos tal exercício piedoso, você fez uma breve apresentação da oração do terço e da devoção à Santíssima Virgem. Lembro-me bem. Estava meio acuada lá trás, ressabiada, temendo ouvir o que não gostaria. Então te ouvi falar: ‘– Existem pessoas que deixam para rezar o terço à noite, depois da lida’. (Eu era uma delas!!!!!) Você continuou: ‘– Aí tudo acontece assim: começam cansados, bocejando, mas vencem o primeiro mistério; gaguejam no segundo e, no terceiro… pronto, já estão dormindo!!’ (Euzinha novamente). Pensei então: agora virá a bronca; a acusação de que temos pouca fé; de que somos irresponsáveis, vacilantes na oração blá, blá, blá. Mas então aconteceu como eu não esperava. Você continuou: ‘– Quando isso acontecer, gente, não se martirizem sendo demasiadamente exigente consigo mesmos! Estamos diante de uma Mãe Clemente e Consoladora dos aflitos, de uma Mãe amável e admirável e também Auxiliadora dos cristãos. Ela conhece nossas lutas e nosso cansaço, pois está sempre atenta para não nos deixar faltar a alegria da fé. Quando isso acontecer, aprendam a dormir serenamente nos braços de uma tão terna mãe a fim de que quando acordemos, ‘aqui ou lá’ estejamos dispostos a fazer o que o seu Filho nos disser, ou a viver para sempre em sua companhia. Então eu me desarmei. Chorei. Tirei um peso das costas e decidi recomeçar”. Também emocionado recebi um abraço forte e cheio da Angélica que renovou sua fé confiando na Mãe da Divina Graça, na Mãe do Bom Conselho.  

Não há o que temer em nossa devoção à Maria, irmãos. Sabemos que o único desejo de seu materno coração é que cada um dos filhos de Deus, aprendam a amá-lo como convém, ou seja, fazendo tudo aquilo que seu Filho nos disser. Ela aceita os nossos rogos e homenagens, embora acredite que core um pouco de vergonha devido sua grande humildade, mas aceita porque sabe e nos revela que é Rainha por causa do Rei, que é Senhora, por causa do nosso Senhor, que é Bendita, porque Bendito foi e é o fruto de seu ventre, que é Bem-aventurada, não por privilégio, mas por obra e graça Daquele que nos dispôs para a beatitude, para a santidade.

Não duvidemos: se de Eva herdamos nossa pecadora condição, de Maria, proclamada Ave pelo anjo, herdamos nossa redimida condição. Não sem razão cantamos no Ofício da Imaculada Conceição: “sois Mãe criadora dos mortais viventes”! De Eva, o pecado! Da Ave-Maria, o Cristo, nossa remissão; nossa redenção. Quando Jesus no-la deu aos pés da cruz sabia que sua mãe haveria de conduzir para Deus todos os seus irmãos e irmãs conquistados ao preço da cruz. Como, então, não cantar: ó surpresa de Deus, maravilha de Deus preferida de Deus, alegria de Deus. Ó silêncio de Deus, arco-íris de Deus, ó sonho lindo de Deus, sacrário vivo de Deus”! De fato, neste mundo, “um amor mais forte que tudo, mais obstinado que tudo, mais duradouro que tudo, é somente o amor de mãe”! Por isso, desse maternal amor, não quis Deus nos privar… nem ao seu próprio Filho nascido do ventre desta mulher! Bendito e louvado seja Deus. Mãe do céu morena, rogai por nós.

Diác. Robson Adriano

Candidatos ao Diaconato Permanente de BH são instituídos a Leitores e Acólitos

No último domingo, dia 22/11/2020, na Catedral Cristo Rei, em Belo Horizonte, foram instituídos no Ministério de Leitores e Acólitos sete candidatos ao Diaconato Permanente da Arquidiocese de Belo Horizonte.

São eles: Fábio de Brito Goncalves, Gius Carlos Soares Rocha, Márcio Assunção de Paula, Marcos Daniel Machado, Normando Martins Leite Filho, Paulo de Tarso da Silva Reis e Rubens Pereira Lima.

A celebração foi presidida pelo Bispo auxiliar Dom Vicente.

A ordenação diaconal está prevista para o mês de fevereiro/2021.

A CRDE Leste 2 parabeniza e intercede pela vida destes vocacionados.

Estende tua mão ao pobre.

No último dia quinze, como já vem fazendo a alguns anos consecutivos, o Papa Francisco nos lembrou dos “anawins de Yhwh”, ou seja, dos pobres de Deus. E como o termo hebraico anawin, remeta-nos também “àqueles que se dobram”, ou seja, os humildes em espírito que colocam toda a sua confiança no Senhor, pobreza e humildade se conjugam na convocação de Francisco. Por um lado, a miséria daqueles que nos expõe suas necessidades mais prementes como chagas abertas por um sistema perverso; por outro, o convite a reconhecermos que diante de Deus, a bem da verdade, somos todos pobres, necessitados de conversão… pois muitos de nós estamos com a barriga cheia ou o espírito inflado pela autossuficiência. Uma convocação inquestionavelmente louvável e necessária, mas, no mínimo estranha e sintomática. Estranha, uma vez que somos seguidores dAquele que não tendo lugar para nascer, viveu a vida sem ter onde reclinar a cabeça, teve como pai um carpinteiro e não um banqueiro ou empresário, deixou como herança a si mesmo nas migalhas de um sagrado pão, dando ainda ordens para servirmos como ele próprio serviu e como se não bastasse morreu entre dois ladrões sentenciado como fracassado e impostor, como nos atestam os Evangelhos. Haveria mesmo necessidade de um dia assim convocado se compreendêssemos que todos os dias a fé assim nos convoca? Não cuidar dos pobres nunca foi e nem nunca poderá ser uma opção; ao menos não uma opção cristã! Trata-se de um imperativo: “dai-lhes vós mesmos de comer”! (Lucas 9, 13).

Confesso meus irmãos: nunca foi tão difícil falar dos pobres, ou falar por eles!!!! Muito rapidamente vozes uni troantes se levantam, dentro e fora da Igreja, para classificar a atenção e o cuidado para com os pobres de fascismo, comunismo, socialismo etc e tal, alardeando aos quatro cantos do mundo que o socorro aos pobres foi uma ideologia plantada no coração da Igreja para fazê-la perecer como uma ONG malsã! É necessário, continuam em seu furor, exorcizar toda teologia da libertação até ao cúmulo de negar a razão de fé de inúmeros de nossos pastores que, compreendendo a sagrada missão do pastoreio junto aos mais pobres e necessitados, replicaram do Evangelho nos exortando no Concílio: As alegrias e as esperanças, as tristezas e as angústias dos homens de hoje, sobretudo dos pobres e de todos aqueles que sofrem, são também as alegrias e as esperanças, as tristezas e as angústias dos discípulos de Cristo; e não há realidade alguma verdadeiramente humana que não encontre eco em seu coração (GS 1)”.

Há alguns dias, participando de um tríduo em preparação para a ordenação diaconal de alguns irmãos, fiquei edificado por um gesto simples, mas extremamente significativo, e quase já esquecido na Igreja: após a oração final, o celebrante chamou à frente duas senhoras. Uma delas deduzi facilmente quem seria: carregava as vestes litúrgicas do acólito que seria ordenado. A humilde senhora era sua mãe. A outra, simples e humilde, trazia nas mãos uma pequena caixinha. Depois de abençoadas as vestes litúrgicas, o celebrante voltou-se para o acólito, dizendo-lhe que toda a comunidade, mas principalmente os pobres, lhe queriam ofertar um presente: abriu a caixinha e apresentou ao acólito um anel de Tucum. A “senhorinha”, depois da bênção, colocou-lhe no dedo o anel, profetizando um ministério na companhia dos mais empobrecidos e necessitados, e sem dizer absolutamente nada, dizia, com seu gesto, absolutamente tudo: não se esqueça dos pobres do Senhor! Ele veio para servir, não para ser servido!

Fiquei dez dos melhores anos de minha vida no processo formativo do Seminário de Mariana e sou extremamente grato por isso. Sou de uma geração em que homens de esmerada humanidade e dedicação ao Reino e profunda espiritualidade me ensinaram a contemplar Jesus nos pobres e vice e versa, sem medo ou contradições, sem ideologia e com+paixão, fazendo-me ver a incongruência de uma espiritualidade que priorizasse somente a fé, sem o engajamento nas mudanças estruturais injustas, ou priorizasse tão somente as realidades estruturais e materiais tendendo a transformar a Igreja numa ONG. Homens que amaram profundamente a Igreja por terem amado ainda mais profundamente a Cristo, seu fundador, que amou os pobres prometendo-lhes o Reino de Deus. Somente para citar alguns, homens como Pedro Casaldáliga, defensor dos indígenas e marginalizados, adotando como lema de sua ação pastoral: “Nada possuir, nada carregar, nada pedir, nada calar e, sobretudo, nada matar; homens como Dom Helder Câmara, que congregou nossos bispos em conferência, defendendo arduamente os direitos humanos; poeta dos pobres e da não-violência; homens como Dom Luciano que morreu fazendo um pedido: não se esqueçam de “meus” pobres! Tantos e tantos mais que marcaram minha vida com um testemunho autêntico de fé. Ensinaram-me que se “pobres sempre os teremos conosco” (como nos ensinou o Senhor em João 12, 8), a fortiori deverá ser permanente também o zelo pastoral para com estes pobres, nossos mestres.

O Papa Francisco, nessa incômoda insistência que nos descentraliza, e que não propõe absolutamente nada de novo do que o próprio Jesus nos propõe, recupere para nós a certeza de que uma espiritualidade autenticamente cristã não poderá jamais propor-se em substituição à fome dos milhares e milhares dos quatro terços da humanidade, nossos irmãos, que passam fome de pão e de fé. Prossigamos, e rezemos pelo nosso Francisco a fim de que Deus o preserve da mira dos que “odeiam a fé” e não aconteça, agora na cidade do Vaticano, o que outrora aconteceu no “fim do mundo” com um pastor que incorporando à sua fé e à sua missão o Concílio Vaticano II afirmava:  “a mais profunda revolução social é a reforma séria, sobrenatural, interior de um Cristão. A missão da Igreja é identificar-se com os pobres. Assim a Igreja encontra sua salvação”. São Oscar Romero, rogai por nós!!!

Diác. Rosbon Adriano

Quero a Misericórdia e não o Sacrifício!

Temos acompanhado nos últimos dias reações as mais diversas acerca do pronunciamento do Papa Francisco sobre certa postura cristã em relação aos direitos civis das pessoas homossexuais e homoafetivas. Reações de julgamentos apressados e distorcidos dentro e fora da Igreja. Desde uma mídia viciada e mal-intencionada (à serviço de uma visão reducionista como geralmente é a própria visão de boa parte das pessoas que fazem parte desse grupo e levantam essa bandeira), passando por leigos e leigas confusos que juraram afastar-se da Igreja por não se verem representados por um Papa assim ou até mesmo padres que, em homilias, vaticinaram a alto e bom tom ser o Papa um herege necessitado de conversão, causando revolta no fiéis presentes que, em parte, abandonaram a celebração revoltados com seus párocos.

Um Papa que, convidando à acolhida e à misericórdia antes que ao julgamento (como fez o próprio Jesus no caso da samaritana ou da adúltera prestes a ser apedrejada), é contestado quase que odiosamente e tratado com inclemência e intolerância, até mesmo entre aqueles e aquelas a quem ele pediu a bênção, antes mesmo de abençoar, no dia em que foi apresentado ao mundo como Papa Francisco. A palavra de Jesus de que no mundo haverei de encontrar aflições (João 16, 33) torna-se real e intensa para o para o Papa do fim do mundo que descobre com sofrimento que o mundo pode ser a sua própria casa, as ovelhas de seu próprio rebanho.

Mas creio que o Papa Francisco não se admira de tais reações, não se intimida ou fraqueja, pois tem sempre diante de si o fracasso e a loucura da cruz e a fidelidade de quem ele nos pediu que olhássemos mais em seu pontificado: nosso Senhor Jesus Cristo. Sabe que com o Mestre foi mesmo bem assim: “este homem acolhe os pecadores e come com eles”! (Lc 15, 2); ou, “se esse homem fosse profeta saberia que a mulher que está tocando nele é uma pecadora” (Lc 7, 39b), enquanto a pecadora lavava os pés de Jesus com as lágrimas, enxugando com o cabelo, beijando-os e lançando neles perfume. Ou ainda: “pode, por ventura, vir alguma coisa boa de Nazaré”?, perguntava-se Filipe, um dos escolhidos, questionando a identidade de Jesus. Não é o que ouvimos hoje: pode, por ventura, vir alguma coisa boa do “fim do mundo?” Nada fácil é compreender que desde a Antiga Aliança, firmada pela Lei, até a Nova Aliança, firmada pelo sangue de Cristo, tudo o que Deus quer é a misericórdia, em primeiro lugar, pois sem ela o sacrifício torna-se uma prática da boca para fora, não envolvendo o coração e, portanto, uma prática não compassiva. Por isso mesmo Jesus, retomando os preceitos da Antiga Lei (Oséias 6,6) nos incita: “ide e aprendei o que significam estas palavras: Eu quero a misericórdia e não o sacrifício. Eu não vim chamar os justos, mas os pecadores!” (Mateus 9, 13). Mas pecadores somos todos, nos confirma a Palavra (!João 1, 8). Mas nosso pecado pode ser ainda maior e à ele somarmos o sermos injustos… inclementes…impiedosos!

Vivemos tempos difíceis! Conciliar uma experiência religiosa cristã autêntica com a expressão contemporânea de uma autonomia baseada unicamente na referência a si mesmo como valor absoluto é uma tarefa complexa, exigente. Tudo e todos parecem operar na única ótica do EU: faço, quero, posso, vou… meu, para mim, comigo e por mim. A vida é minha, o corpo é meu, tenho o direito de ser eu!! Ouvir a voz de Deus mais que a própria voz, assumir o projeto de Deus mais que o próprio projeto, reconhecer-se pecador mais do que auto-justifcar-se torna-se cada vez mais sinônimo de perder a própria autonomia e abandonar as rédeas da própria vida. Ainda assim, é preciso fazer ressoar no fundo da própria convicção a confrontação necessária com a constatação evangélica da experiência do próprio Jesus: “Não se faça, todavia, a minha vontade, mas sim a tua” (Lc 22, 42b). Depois verteu sangue em poros, tamanha era sua agonia, sua angústia por ter compreendido que crer e dar a vida pelos de Deus, sendo-lhe fiel até o último instante, era renunciar a si mesmo por um amor maior! Haverá ainda em nosso tempo amor maior que o EU? Teremos coragem de assumir nossas próprias limitações do que justificar nossas vontades? Lançaremos ao chão as pedras que carregamos nas mãos ou ousaremos insensatamente lança-la na direção da pecadora?

Uma situação real, no que tem de intenção, me fez pensar e acolher a mensagem do Papa Francisco que reflete, na verdade, as intenções do próprio Cristo em termos de uma acolhida misericordiosa: depois de viver quinze anos com uma companheira, num relacionamento estável, M.L perdeu a companheira num acidente automobilístico ficando ela mesma lesionada em uma de suas vértebras, impedida de movimentar-se em seus membros inferiores. A três anos as duas cuidavam de uma criança em processo de adoção. Ao tentar fazer uso dos bens que a companheira havia herdado de sua família e agora deixava, bens que ela mesa também ajudou a expandir, foi-lhe negado com a justificativa que não teria direito algum nos bens. Os familiares da companheira reivindicaram o direito aos bens sem levar em conta a situação atual de M. L. ou a intenção da que havia falecido. Pergunto: exigir algum direito para M. L, na ordem do direito, ou seja, de nossa civilidade, seria trair o Evangelho? Tornar-nos-íamos hereges? Parece que é a essa possibilidade de garantia de direitos que o Papa se referiu quando propôs que a sociedade precisa resguardar tais pessoas a fim de não ficarem expostas a injustiças e preconceitos descabidos. Não estaria aqui a possibilidade de expressarmos o quanto, na prática da civilidade, amar ao pecador, não obstante repudiando o seu pecado, é expressão de misericórdia? Estaríamos dispostos, ao menos a dialogar, ou estaremos obrigados em sã consciência a concluir com o Apóstolo: Para onde iremos, Senhor? Só tu tens palavras de vida eterna”!  (João 6, 68).

Diácono Robson Adriano

Diácono permanente é eleito presidente do Conic-MG

O diácono permanente Amauri Dias de Moura, da Arquidiocese de Belo Horizonte-MG, foi eleito presidente do Regional Minas Gerais do Conselho Nacional das Igrejas Cristãs do Brasil (Conic-MG). A Assembleia-Geral Ordinária e Eletiva do Conic-MG ocorreu na tarde de sábado, 7 de novembro. Devido às restrições da pandemia, a reunião foi realizada por videoconferência.

No encontro, foram avaliados também os relatórios de atividades e o parecer do Conselho Fiscal referente à gestão 2018 a 2020. A nova diretoria exercerá o mandato até 2022.

“Servir a todos e todas com a força das nossas Igrejas, com o específico de nossas Igrejas, o específico de nossos grupos, somados, irmanados, acolhendo essa diversidade como dom e compromisso”, declarou o Diác. Amauri.

Nascido em 6 de outubro de 1976, em Belo Horizonte, o Diác. Amauri foi ordenado em 18 de novembro de 2017.

 

Conheça a nova diretoria do Conic-MG:

Presidente: Diác. Amauri Dias de Moura (Igreja Católica Apostólica Romana)

Vice-presidente: Rev. Bernardino Ovelar Arzamendia (Igreja Episcopal Anglicana do Brasil)

1º secretário: Janett Alves Teixeira (Igreja Católica Apostólica Romana)

2º secretário: Pr.ª Mara Parlow (Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil)

1º tesoureiro: Alex Sandro de Oliveira Sodré (Igreja Episcopal Anglicana do Brasil)

2º tesoureiro: Rev. Pr. Jorge Eduardo Diniz (Igreja Presbiteriana Unida)

Conselho Fiscal:

Titulares:

Rev. Robert Delano de Souza (Igreja Episcopal Anglicana do Brasil)

Pr.ª Aneli Schwarz (Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil)

Rev. Antônio Marcos de Souza (Igreja Presbiteriana Unida)

Suplentes:

Edward Neves Monteiro de Barros Guimarães (Igreja Católica Apostólica Romana)

Rev. Daflas Alexandre da Cruz (Igreja Presbiteriana Unida)

Maria de Fátima Cerqueira (Igreja Católica Apostólica Romana)

A Igreja particular de Mariana ordena 14 novos Diáconos Permanentes

Confirmando a diaconia na Igreja como verdadeira expressão da Sacramentalidade do serviço.

No último dia primeiro de novembro, do ano corrente, a Igreja particular de Mariana, sob o pastoreio de Dom Airton, celebrando todos os santos, realizou na Basílica do Sagrado Coração de Jesus, em Conselheiro Lafaiete, a celebração eucarística na qual foram ordenados 14 novos diáconos permanentes para servir a esta parte da Igreja situada na Primaz de Minas. Depois de um longo processo de preparação na Escola Diaconal São Lourenço, homens casados (exceto um deles que prestou o juramento celibatário para dedicar-se mais completamente ao serviço ministerial) assumiram o compromisso de expressar pela radicalidade do serviço o amor que tem a Deus e à causa do seu Reino.

Revigorada pelos ares conciliares, a Igreja redescobriu o valor ministerial da diaconia como expressão, por excelência, de uma Igreja toda ela ministerial. Constituída por homens e mulheres de todas as raças e línguas, batizados no nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo, a Igreja assumia o serviço como autêntica expressão de amor e instrumento privilegiado para a construção do Reino de Deus. Recuperava, assim, antiquíssima prática que encontrava em Jesus o seu fundamento. Ele próprio nos indicou explicitamente sua condição pelo ato mesmo de servir: “Eu vim para servir, não para ser servido!!” (Mateus 20, 28). A atitude serviçal, pois, não é uma atitude subjetiva de cada cristão, um mero ato da vontade, como se estivesse em questão servir ou não servir. Trata-se de um imperativo cristão; de um proceder em relação aos outros, sobretudo aos mais pobres e necessitados, os excluídos da sociedade, que constitui um dos bens espirituais mais sagrados que Cristo nos confiou: servir como expressão de amor!

Na icônica cena de lava pés (João 13, 1-17) Jesus, depois de tirar o manto, atou uma toalha à cintura (à modo de um avental pois depois deu-se a si mesmo como alimento as seus) lavou os pés de seus discípulos e depois de colocar o manto proclamou: “Vocês me chamam de Mestre e Senhor, e dizem bem, pois EU SOU! Portanto, se eu assim o fiz, façam vocês também o mesmo. Dei-vos um exemplo a fim de que, assim como eu faço, vocês também o façam”!  Detalhe: o relato do Evangelho não diz que o Senhor retirou da cintura sua toalha, seu avental. Há nesta não referência uma evangélica intencionalidade: neste instante, em nome do EU SOU, Jesus “sacramentalizou” o serviço como o sinal permanente da doação de si à edificação do seu Reino de justiça, paz e amor. E assinou posteriormente este testamento, não com as letras da Lei, mas com seu sangue na cruz, na entrega total da vida doada como máxima expressão de quem ama e é fiel ao Pai, amando e sendo fiel aos pobres e marginalizados. Dessa forma, todo cristão que, não renunciando a cruz, perfaz o caminho do discipulado pelo serviço, é sinal visível da promessa feita por Cristo de estar conosco todos os dias até o final dos tempos. Pelo serviço, tornamo-nos alimento de esperança a quem tem fome do Reino de Deus.

Parabéns aos novos diáconos da Igreja Particular de Mariana e a todos os diáconos ordenados no Brasil afora pela Igreja Católica. São Lourenço os ensine sempre amar a Jesus com todo ardor e a entregar sua vida e ministério a serviço do Reino. Maria Santíssima, a mãe do serviço, apresente sempre a seu filho Jesus suas intenções e as intenções de vossas famílias, pois como bem sabemos, é a família, para o Diácono Permanente casado, o primeiro campo de sua missão. 

Diácono Robson Adriano

Presidente da Comissão Arquidiocesana dos Diáconos.

Vida e morte: realidades da mesma existência

“Para os que creem em vós, a vida não é tirada, mas transformada.” Esse trecho, retirado do Prefácio dos Fiéis Defuntos I, pode ser visto em algumas lápides cristãs mundo afora. A relação vida-morte-vida é um dos fundamentos de nossa fé cristã. Para os seguidores de Jesus, não é possível separar esses eventos, e precisamos ser vigilantes para aprender as lições que elas têm a nos dar.

Ainda me inspirando na liturgia, destaco um episódio único da vida: o dia de nosso batismo. A celebração desse sacramento é carregada de símbolos riquíssimos que remetem a Cristo, no qual somos mergulhados, enxertados, configurados.

Conforme o costume em muitos lugares, no caso do batismo de crianças, o rito inicia-se com o bebê nos braços da mãe. Tal como fez Maria em relação a Jesus (Lc 2,22-32), a mulher apresenta a Deus e à comunidade o fruto de seu ventre, de seu do coração. Após consagrar o rebento ao Criador, no fim da celebração, quando a criança já está inserida no corpo de Cristo, ocorre a bênção solene. Reza-se pelo neófito, pelos pais, padrinhos, pelos outros presentes. Nessa hora, novamente a criança está no colo da mamãe. É como se Deus dissesse: “No ventre, no coração, você gerou esta preciosa criança e a consagrou a mim, agora eu a devolvo a você e lhe dou a missão de cuidar dela para mim”.

Existe uma bela relação do batismo com as exéquias (ritos fúnebres). Além da presença da água, com a qual o corpo e o túmulo são aspergidos, há a prece da “encomendação”, quando a família, os amigos e a comunidade entregam, devolvem a Deus a pessoa querida. Um emocionante, não raro difícil, ofertório, pelo qual colocamos nas mãos do Senhor tudo o que aquela pessoa representou em nossa história: as vitórias, as fraquezas, as alegrias, os assuntos interrompidos, as broncas, os frutos de sua missão nesta terra. E o Deus misericordioso acolhe, na vida plena, o filho ou a filha tão amada.

Os vivos e os mortos para o cristianismo

Para o cristianismo, o olhar sobre a vida e a morte costuma ser bem deferente. Quando oramos em favor de alguém que já se foi, não estamos nos referindo a mortos. Segundo nossa fé, trazemos ao coração pessoas vivas, irmãos e irmãs que estão em outra realidade (veja novamente a frase litúrgica a abrir este texto).

Há, por outro lado, muitos “mortos” perambulando por aí. À primeira vista, parecem até vivos e “bem de vida”. Estão de pé, conversam, comem e bebem, até compram e vendem. Entretanto, a todo instante, maquinam um modo de promover a violência, a injustiça, a discórdia; enfim, mais morte. Estar nas trevas é a morte.

Podemos também trazer dentro de nós experiências alternadas de morte e de vida. Quem nunca se deparou, já no fim do dia, com um arranhão ou um hematoma no corpo? Onde nos ferimos? Por que nem notamos nossas próprias feridas? Qual de nós presta atenção à própria respiração, sentindo o prazer de nutrir-se do sopro vital nos dado como graça? Onde estávamos em nossos instantes de morte e vida? Quantas vezes, pelo pecado, nós nos afastamos de Deus? Como o joio e o trigo, portamos a vida e a morte, ciscos e travas, sempre mais fáceis de apontar quando é no outro.

Não é demais recordar: “Eu vim para que todos tenham vida, e a tenham em abundância” (Jo 10,10b). Não interessa tanto ou quanto tempo estaremos por aqui, mas o como, mesmo nos arranhões de nossos dias.

Pendências

Na década de 1990, ajudei a produzir uma reportagem sobre a morte. Não me estranhem, mas confesso: foi um dos trabalhos mais marcantes de minha carreira profissional. Uma pena, mas não recordo bem os detalhes dessa matéria, mas ficou marcada para mim uma pergunta feita por um tanatólogo, profissional especializado no fenômeno vida-morte: se eu receber a notícia de que morrerei daqui a quinze minutos, como aproveitarei meu tempo restante?

Segundo o estudioso cujo nome se perdeu em minha memória após tantos anos, se uma pessoa tem o desejo de resolver várias pendências emotivas e práticas em intervalo tão curto, significa que ela vai morrer mal, porque viveu mal. Morre bem quem vive bem, conforme nos disse naquela ocasião. Como esquecer essa máxima? Quanto ensinamento a morte pode nos dar!?

A Sagrada Escritura, com destaque para os Evangelhos, sempre nos chama à vigilância. Devemos estar acordados e bem preparados para o encontro com o “noivo”, o “senhor da vinha”, o “patrão”, o “ladrão”, Aquele que chega sem avisar. Precisamos ter combustível suficiente para nossas lâmpadas, o óleo da experiência pessoal e intransferível.

Preocupação pastoral na pandemia

A elaboração do luto é outro aspecto da vida-morte-vida que não pode ser ignorado. Em um contexto industrial e urbano como o nosso, e mesmo em nossas comunidades de fé, há uma tendência em jogar para debaixo do tapete a carga da morte. Quanto crucifixo não foi trocado por uma imagem de Jesus já ressuscitado? Um modismo questionável não somente do ponto de vista artístico, litúrgico e catequético, mas que pode nos levar a ocultar outros crucificados e cruzes da vida, inclusive a implacável dor de uma perda.

Pelo olhar antropológico, precisamos, sim, de ritos fúnebres, de viver o luto. Nesses dias, é melhor o roxo ao dourado. Embora devamos testemunhar a vitória da vida sobre a morte, como manda nossa mais básica fé, necessitamos dessa pausa.

Como ministro ordenado e próximo à realidade eclesial de um querido povo, admito que estou apreensivo por muitas famílias não poderem manifestar o luto nestes difíceis tempos de pandemia. As pessoas falecidas em decorrência da covid-19 tiveram de ser sepultadas às pressas, sem os devidos ritos que cada cultura reserva a seus mortos. As despedidas, mesmo para quem partiu por outros motivos, são breves, superficiais, praticamente à beira do túmulo.

Teremos de buscar uma solução pastoral, ainda que seja preciso esperar um pouco. Visitas às famílias, escuta, dias de oração e homenagens, criação de memoriais, parceria com profissionais… Alguma coisa precisará ser feita em nossas comunidades. Ciclos precisarão ser encerrados e pensadas muitas feridas ainda latejantes. Como é difícil compreender o glorioso Domingo da Ressurreição sem a Sexta-Feira da Paixão!

Dedico este texto a meu sogro, o sr. Moacir Alberto de Oliveira, falecido em 25 de outubro último. Bendito seja Deus por sua vida!

Artigo publicado originalmente no blog da Província Brasil Norte da Congregação das Irmãs Missionárias Servas do Espírito Santo (SSpS): blog.ssps.org.br

Alessandro Faleiro Marques

Diácono permanente na Arquidiocese de Belo Horizonte, professor de Língua Portuguesa, editor de textos para as irmãs servas do Espírito Santo.

Arquidiocese de Montes Claros realiza retiro de Formação para Diáconos Permanentes

Com o tema “O Diácono como Servidor nas e das Comunidades Eclesiais Missionárias” aconteceu no dia 10 de outubro de 2020, na Comunidade Esdras, um dia de formação e espiritualidade para os diáconos permanentes da Arquidiocese de Montes Claros. Participaram deste encontro dezoito diáconos permanentes, outros 16 já haviam feito o retiro no dia 26 de setembro conduzido pelo padre Gledson Eduardo de Miranda Assis.

            O retiro, que seguiu todos os protocolos de prevenção ao Covid-19, foi conduzido por Dom João Justino de Medeiros Silva, Arcebispo Metropolitano de Montes Claros, que trabalhou na perspectiva da oração, meditação e celebração, no horizonte daquilo que é recomendado pelo papa Francisco e à luz das orientações da Assembleia Arquidiocesana de Pastoral.

            Nesse dia, aprofundou-se a temática do anúncio da palavra, ou seja, o diácono como servidor da Palavra e também  o diaconato como Serviço aos Pobres e o Diácono como Guardião do Serviço.

A formação teve seu referencial nos textos do magistério do Papa Francisco sobre o diaconato; o que oportunizou ao arcebispo metropolitano, junto aos diáconos,  vivenciar a partilha e escuta, levando os temas abordados à vivência da igreja particular de Montes Claros.

Para o diácono João Batista, participante da formação, o retiro foi muito  proveitoso: “Como foi bom esse Retiro com a orientação do nosso Pastor, ouvindo sua voz (ESCUTA), ajuntando com ele, observando os caminhos apontados, examinando e comungando com ele as preocupações com o Redil e com as outras ovelhas desgarradas, esquecidas, desprotegidas, desfiguradas, feridas, machucadas, com sede e com fome!”

Dom João Justino ressaltou a importância deste encontro “testemunho que foi um dia muito fecundo, sobretudo porque os diáconos levaram muito a sério as propostas… A partilha possibilita tocar de forma muito experiencial a vida e a história de cada um dos diáconos permanentes” e se mostrou satisfeito com o formato do retiro: “Acredito que esta modalidade de encontro abre as perspectivas para outros encontros neste mesmo formato.”

A formação foi encerrada com a Santa Missa seguida de um jantar servido aos participantes.

Santidade, Perfeição ou Misericórdia?

A inspiração para o texto dessa semana vem com a pergunta de um jovem crismando, o Teófilo, mais uma vez, o amigo de Deus, como seu nome significa. Num encontro virtual, mas de forma bem realística, ele me questionou: – O que Deus quer de nós, diácono? Quer que sejamos santos ou que sejamos perfeitos?  Tem jeito isso, “véi”?!

Tem jeito sim Teófilo, e significa algo bem mais simples do que suspeitamos. A questão do nosso crismando é pertinente, sobretudo se nos voltarmos para a Palavra de Deus e tirarmos dela nossa fonte de inspiração. Por ela Deus nos admoesta: “Sede santos, porque eu sou santo”! (Levítico 11, 44). E essa admoestação foi confirmada pelo Apóstolo Pedro que assim se expressa: “‘Sede santos, porque Eu Sou santo!’ … Vós, no entanto, vos santificareis e sereis santos, pois Eu Sou Yahweh, o SENHOR vosso Deus” (1Pedro 1, 16), fazendo menção aos preceitos veterotestamentários, ou seja, do Antigo Testamento. Dessa forma, antigo e novo testamento nos apresentam o mesmo preceito: a santidade.

Mas interveio Teófilo, inquieto: – Mas no evangelho de Mateus está escrito – “Sede perfeitos como vosso Pai é perfeito”!  (Mateus 5, 48), diácono. E foi logo compartilhando a tela, mostrando-nos o texto como se lê para que não tivéssemos dúvidas.  – E então, é para sermos santos ou perfeitos?   

Coloquei ainda mais lenha na fogueira quando, ao invés de responder como ele queria, fiz outra observação, mas indicando agora o evangelista Lucas, que em algumas traduções não admoesta nem à santidade e nem à perfeição, mas à misericórdia!! Lemos: “Lemos: Sede misericordiosos como vosso Pai é Misericordioso!” (Lucas 6, 36). Ainda mais perplexo Teófilo se expressou: – Ih, agora lascou!!!!! É para ser santo, perfeito ou misericordioso? Aí deu ruim diácono!!!

Depois que rimos um pouco da “saia justa” na qual Teófilo se encontrava, fiz uma provocação: E se não precisássemos escolher entre um dos preceitos? E se ao invés de ou santidade, ou perfeição, ou misericórdia, estivéssemos sendo admoestados a sermos santos, perfeitos e misericordiosos? E se o projeto de Deus levasse em conta as três realidades?  Talvez seja essa a postura mais adequada.

Para tanto, teremos de partir do menor e mais importante versículo bíblico. Menor em extensão, mas absolutamente talvez o mais importante por ser aquele que define o ser mesmo de Deus: sua santidade, sua perfeição, sua misericórdia! Eis o versículo: “Deus é amor”! (1 João 4, 8b).  E todo aquele que ama mostra que vem de Deus e está com ele, pois no versículo anterior ainda lemos que “o amor vem de Deus”.

Em seu amor Deus nos destinou para sermos santos, que etimologicamente sugere ser separado, consagrado, posto à parte, como que preservado, uma porção escolhida. A santidade que Deus espera de nós é não nos conformarmos (mente e coração) com as coisas deste mundo, seus esquemas injustos e sua maldade, mas agirmos como filhos da luz. Para isso “ele nos criou com bênção espirituais em Cristo e nos escolheu nele antes ad criação do mundo, para sermos santos e irrepreensíveis, diante de seus olhos”! (Efésios 1, 2-4). O amor, pois, nos destinou à santidade.

Esta condição de santidade nos coloca no mundo de forma diferenciada, capazes de romper com o ciclo da violência e do ódio pelo vínculo do amor. Somente pelo amor compreendemos que não se trata de sermos perfeitos no sentido de não possuirmos limitações e fraquezas, mas no sentido de vivermos a perfeita ação de amar, a Deus em primeiro lugar e por extensão ou consequência aos irmãos e irmãs. Trata-se, antes, de sermos perfeitos no amor: “No amor não há medo. Antes, o perfeito amor lança fora todo medo … e quem tem medo não é perfeito no amor”! (1 João 4, 18).

Quando compreendemos esta nossa missão de perfeição no amor, compreendemos igualmente que a única expressão realmente válida de amor é a misericórdia, que nos ensina a olhar-nos, olhar os outros e ao mundo com o coração de Deus revelado no coração sagrado do Filho que nos deu a máxima expressão de amor do alto da cruz: “Pai, perdoai-lhes, eles não sabem o que fazem”! E antes disso, para que não tivéssemos dúvida alguma de que a misericórdia é a autêntica expressão do ser de Deus, nosso Pai, nos ensinou: “todas as vezes que fizestes isso a um destes meus irmãos mais pequenos, foi a mim que o fizestes”! (Mateus 25 40b). O que fizeram, perguntar-nos-íamos? Agiram com misericórdia.

Pois é meu caro Teófilo! Vês como não só é possível como é esta nossa missão. Estar neste mundo, mas com ele não se conformar; sermos perfeitos no amor, jogando fora todo medo; agindo com misericórdia, pois não podemos dizer que amamos a Deus, se desprezamos nossos irmãos. Deus, com seu Espírito, nos confirme sempre em seu amor!

Diácono Robson Adriano

robsonfil@gmail.com